sexta-feira, 3 de abril de 2015

Rolando na Vitrola: Television - Marquee Moon (1977)


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Quem pensa punk nasceu na Inglaterra está redondamente enganado, pois o pai dele conhecido como Malcom McLaren fez curso e estágio antes no EUA, e durante a sua estada na terra do tio Sam fez barulho não apenas vendendo as suas extravagantes roupas, mas ao empresariar uma banda de caras que se vestiam e pintavam-se como mulher, ou seja, o New York Dolls, mas antes desses caras ainda temos que falar do ponta pé dado lá atrás com o The Stooges e com o MC5, pois daí para adiante as coisas se desenrolaram incrivelmente bem, pois até uma poetiza o gênero tinha, a Patty Smith, os Ramones é quem deram o ponta pé na coisa e fizeram o negócio pegar fogo com o debut incendiário.
Os EUA são mesmo a terra das oportunidades, das grandes invenções não apenas tecnológicas, mas também de grandes revoluções sonoras. A agressividade, a insanidade, a poesia e o niilismo do Velvet Underground foram o combustível para esse famigerado gênero transgressor, o punk rock. A cidade de New York nunca foi à mesma depois daquela explosão atômica, o CBGB o grande templo vibrava noite à após noite com toda esta efervescência que dominava os corações, as almas e refletiram nitidamente o espirito daqueles dias cujo legado iria a lugares inimagináveis.
A história do Television começa quando Tom Verlaine e Richard Hell, montaram a banda Neon Boys em 1971, os outros integrantes como Billy Frica e Richard Lloyd chegaram depois para completar o time e o nome também mudaria e o escolhido foi Television. Richard Hell saiu em 1974. No seu lugar entrou Fred Smith, que antes era baixista do Blondie e depois de finalmente resolver os problemas  de formação da banda que se estabilizou com esse line-up os caras no mesmo lançaram um single e no ano de 1976, os caras assinaram com Elektra Records (que teve no cast Iggy Pop e MC5 que nesses dias faziam parte do passado). Em 1976, com a produção do próprio Verlaine e o engenheiro de som Andy Johns (que foi creditado como coprodutor) gravaram Marquee Moon em setembro no A & R Recording, em New York City.  
Só que ao contrário do que o Ramones, o Dead Boys faziam os rapazes do Television investiam em uma sonoridade mas complexa cuja elaboração os aproximava as influências de  bandas como a de Neil Young e os seus Crazy Horses, The Doors e por ai vai. Apesar dessa influência rock os caras tinham suas influências do jazz, o som estilo jam session. O som homeopático, hipnótico e eclético dos caras colocava-os em outra dimensão sonora, pois aquele som refinado e sentimental, poético a sua maneira era o portal para outras dimensões ainda não exploradas.
O disco chegou às prateleiras nova-iorquinas em fevereiro de 1977 e no Reino Unido em apenas no quarto dia de março, a mídia especializada caiu de amores pelo disco, o público idem. Também não era para menos, pois quando você deita a agulha sobre a bolacha e logo na abertura tem “See no Evil” um tema mais do que sugestivo e cheio de fantasias e possibilidades ilimitadas, um rock and roll sem firulas, narrativo, de uma beleza singular. “Venus” é outro grande momento, pois além das referências de Verlaine as suas experiências psicodélicas (LSD) e também “cai nos braços de Venus de Mileto”, uma torrente de emoções em constante mudança, alterações de pensamento.
Em “Friction” os solos de Verlaine transitam entre a  sobriedade e a insanidade, mas passam a maior parte tempo na segunda trilhando um caminho sem volta, ou seja, uma passagem só de ida para os recônditos da mente. Fechando o lado A, temos talvez a música mais poderosa do disco, a épica, Marquee Moon onde o jogo de guitarras gêmeas condensou bem suas influências e pôs para fora o som avant-garde jazzistico e junto a esse pano de fundo existe ai as paisagens urbanas noturnas muito bem narradas de forma poética. Apesar das letras tratarem de assuntos urbanos, ou seja, de lendas Marquee Moon não é um álbum conceitual, mas é um retrato fiel do cotidiano.
O lado B abre com “Friction” que além de ter um clima hipnótico tem na linha de frente belos solos de Verlaine, enfim um mimo para ser repetido até a exaustão no silêncio da noite no seu quarto. “Guiding Light” é a balada, ou seja, todo o disco de rock tem a sua reserva romântica onde o artista apresenta a sua versatilidade e aqui Verlaine e seu companheiro Lloyd fazem exatamente isso, mas esbanjam um talento único difícil de ver por ai. “Prove It”  é perfeita, ou seja, imagética e sintetiza toda a paisagem narrada por Verlaine e sua turma. “Tom Curtain” e sua instrumental melancólica e os vocais lúgubres resumem a obra neste grande final mais do que apropriado.  
Apesar das críticas favoráveis na sua própria terra Marquee Moon não foi comercialmente bem sucedido, pois não registrou vendas superiores a oitenta mil cópias e, portanto, nem entrou nas paradas da Billboard 200, o sucesso do disco aconteceu no Reino Unido onde se firmou na 28° posição no UK Album Charts e por ali as vendas foram alavancadas pelo artigo de duas páginas escrito pelo jornalista Nick Kent da NME, que os colocou na capa da revista e também chamou a assessoria de imprensa da Elektra Records, que por sua vez apoiou a banda a trabalhar no sucesso adquirido no Reino Unido.
A capa do álbum é de autoria de Robert Mapplethorpe, que dois anos atrás havia feito a capa de Horses de Patty Smith. Marquee Moon marcou o fim de uma fase dourado do CBGB, porém o legado sobreviveu e foi a base, ou seja, a pedra angular para o rock alternativo praticado por bandas como o Pixies e muitas outras, e além disso o álbum figurou em várias listas dos melhores de muitas publicações como a Mojo e a Q Magazine que o elencou na sua lista de 200 melhores álbuns do Punk, a revista Rolling Stone por sua vez o colocou na sua lista de 500 melhores discos de todos os tempos. Uma coisa é certa, pois apesar de ser clássico desde seu nascimento e depois do fim, em 1979, é que o Television e os seus integrantes fizeram a sua obra definitiva, pois no segundo álbum Adventure de 1978 e mas suas carreiras não chegaram perto se quer do brilho e da magia de Marquee Moon. Outra coisa certa é que este álbum agrada em cheio qualquer fã de música independente do gênero.      
 
Lista de músicas:
 
A1 See no Evil A
A2 Venus
A3 Friction
A4 Marquee Moon
 
B1 Elevation
B2 Guiding Light (autoria de Verlaine e Lloyd)
B3 Prove It
B4 Tom Curtain